Por Fernanda Casarotto
Médica oncologista e líder técnica do Projeto Visão Zero (IGCC)
Responsável por cerca de 300 mil mortes por ano no mundo, o câncer de colo uterino é uma doença majoritariamente ligada à infecção por HPV e conta com uma vacina gratuita e disponível no Brasil. Ainda assim, temos cerca de 7 mil mortes por ano. O que pode explicar tais mortes, especialmente considerando que este tipo de câncer afeta mulheres jovens, em idade reprodutiva, desejando gestar ou com filhos dependentes?
Muito embora se possa cogitar o problema como algo meramente individual, a tragédia é coletiva. Em 2022, artigo da Nature Medicine mostrou estimativa global de mais de 200 mil órfãos maternos pela doença. Quais são os desdobramentos sociais e econômicos causados por esse enorme contingente de crianças sem mãe em uma família? Como medir tais impactos em uma nação?
Como se suspeita, também nessa doença a disparidade econômica conta muito, mas não explica tudo. Apesar de 90% das mortes ocorrerem em países de baixa e média renda, o Japão cessou a recomendação da vacina entre 2013 e 2021 por conta de falsas suspeitas relacionadas ao imunizante. Em virtude de tal pausa, foi estimado que cerca de 5 mil mulheres poderão morrer no país, conforme estudo publicado no Lancet. Ao mesmo tempo, Ruanda hoje possui um programa modelo de vacinação e rastreio.
No cenário local, segundo a Secretaria Estadual da Saúde, em 2023 foram registrados 1.420 casos – 129% acima da estimativa, colocando o RS na quarta colocação em número de casos no país, com 407 óbitos apenas no ano passado.
Podemos e devemos fazer algo. Em março, o SUS incorporou o teste HPV-DNA para rastreio da doença. Em Porto Alegre, o projeto Visão Zero, desenvolvido pelo Instituto de Governança e Controle do Câncer em parceria com a Prefeitura, vem organizando ações como o Rolê da Vacina nas escolas para aumentar a cobertura contra o HPV e criando estratégias sobre a importância dos exames preventivos oferecidos de forma gratuita nos postos de saúde.
Uma cidade sem câncer de colo uterino começa dentro da cidade, dentro da nossa casa.
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Publicado no Jornal Zero Hora de 03 de abril de 2024
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